LEI DA TERCEIRIZAÇÃO, UM MAL?
- Manoela Nette e Rafael Foschete Meirelles
- 25 de jun. de 2017
- 6 min de leitura

A Lei nº 13.429/2017, vulgarmente conhecida como Lei da Terceirização, dentre outras providências, libera a terceirização para todas as atividades das empresas, deixando de existir a diferenciação entre atividade-meio e atividade-fim. Um colégio, por exemplo, pode terceirizar os serviços de ensino, de coordenação e orientação pedagógica, além dos serviços de limpeza, manutenção e vigilância.
Antes da publicação dessa lei, não existia uma legislação específica sobre a matéria. Havia, no entanto, decisões da Justiça do Trabalho, que permitiam a terceirização apenas para atividades-meio, ou seja, serviços não diretamente relacionados ao objetivo principal da contratante.
Qualquer pessoa jurídica, seja privada ou pública, pode terceirizar serviços, sendo a empresa prestadora de serviços responsável pela contratação, remuneração e direção do trabalho realizado por seus trabalhadores, ou então, pela subcontratação de outras empresas para realização dessas atividades, que é chamada de quarteirização.
Não há vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante. E não é assegurado ao trabalhador terceirizado o direito de remuneração equivalente à percebida pelos empregados da mesma categoria da empresa tomadora e nem ao atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinados a estes.
A classe empresarial aproveitou-se do atual cenário de crise econômica, para conseguir aprovar um projeto de lei que estava parado no Congresso desde 1998, transmitindo a idéia (ideologia) de que a terceirização é uma solução para trabalhadores e empresários, quando na realidade somente privilegia os interesses destes, em prejuízo daqueles.
Historicamente os trabalhadores terceirizados sempre ganharam menos que os empregados contratados regularmente. Isto é evidente, pois o tomador e o prestador de serviços buscam o aumento da mais-valia, ou seja, do lucro, que sai do salário desses trabalhadores. Se a empresa tivesse que pagar pela mão de obra terceirizada, o mesmo valor pago aos seus empregados, a terceirização não compensaria. Essa redução da remuneração do trabalhador é ainda maior quando ocorre a quarteirização.
Outro fator importante para o aumento da mais-valia da empresa contratante consiste no fato de que ela passa a responder subsidiariamente com relação às obrigações trabalhistas da prestadora de serviços. Antes desta lei, havia um entendimento de que esta responsabilidade era solidária.
Além da dispensa grande de empregados, a terceirização promoverá uma rotatividade de trabalhadores no local de trabalho, acarretando em ausência de ascensão na carreira, no arrefecimento da categoria profissional, na alienação do trabalhador e no aumento de acidentes de trabalho e por conseqüência, de custos para a Previdência Social – uma vez que o trabalhador terceirizado, normalmente, tem menor capacitação técnica para o exercício da função.
No setor público, a terceirização de atividades-fim permitirá, de forma indireta, o fim da estabilidade, do ingresso por concurso público, da promoção e progressão funcional, com uma consequente piora na qualidade dos serviços, bem como, um aumento da corrupção, ativa e passiva, e do patrimonialismo, visto que facilitará o preenchimento de cargos públicos por pessoas ligadas a políticos e administradores do alto escalão, contratadas por empresas prestadoras de serviços, fazendo prevalecer interesses privados, em detrimento do interesse público.
Enfim, a Lei da Terceirização, da maneira que foi aprovada, precariza o trabalho, no momento em que debilita as relações e direitos do trabalho, inclusive no serviço público. Mas esse é só o começo da implantação da ideologia neoliberal, pois outros projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional, como os que tratam da reforma trabalhista e da previdência, se aprovados, terminarão por soterrar direitos conquistados ao longo de muitas décadas, a custo de muito “suor e luta” da classe trabalhadora, aproximando-nos de um tempo, não tão distante, no qual o trabalhador era um semi escravo.
Manoela Nette
Terceirização é quando uma empresa prestadora de serviços é contratada por outra empresa para realizar serviços determinados e específicos. A prestadora de serviços emprega e remunera o trabalho realizado por seus funcionários, ou subcontrata outra empresa para realização desses serviços. Não há vínculo empregatício entre a empresa contratante e os trabalhadores ou sócios das prestadoras de serviços.
A Lei da Terceirização, aprovada recentemente no Congresso Nacional Brasileiro, altera os meios pelos quais a terceirização funciona no Brasil, prevendo a contratação de serviços terceirizados para qualquer atividade, desde que a contratada esteja focada em uma atividade específica. Tal Lei atinge empresas privadas, empresas púbicas, sociedades de economia mista, produtores rurais e profissionais liberais, não se aplicando somente à administração pública direta, autarquias e fundações. Uma vez tão abrangente e ampla, além de outros aspectos desfavoráveis, a nova Lei se torna negativa para a sociedade como um todo.
Empregadores afirmam que a nova Lei poderá contribuir para a formação de novos empregos. Porém não é correto afirmar que uma maior abrangência nas terceirizações criará novos cargos para mais trabalhadores, pois, terceirizada ou não, a vaga já está preenchida, o que a Lei muda é como e quem irá ocupá-la.
Tais empregadores declaram também que a Lei da Terceirização melhorará a formalização e a fiscalização dos trabalhadores. Todavia a terceirização abrangente dos trabalhadores resultará na negligência da empresa terceirizada, uma vez que, como todo o contato com os trabalhadores seria feito pela empresa terceirizada, e não pela empresa empregadora, não há garantias de que serão assegurados todos os direitos e deveres dos trabalhadores. A empresa que fornecerá os terceirizados pode, em tese, fazer o que lhe bem entender, sem prestar explicações de seus atos a ninguém.
Dito isso, cabe argumentar que o vínculo entre a empresa empregadora e o empregado se tornará completamente profissional, tênue e simplória. Sem preocupações, salário, impostos, férias, décimo terceiro salário, entre outros direitos, serão responsabilidade da empresa contratada, e a empresa contratante não se relacionará com os aspectos sociais e humanos dos trabalhadores. Pode-se relacionar tal fato à “dominação racional legal”, conceito de Max Weber, que diz que a intensa racionalização do trabalho mata o espírito humano.
A grande abrangência da terceirização traz consigo dois pontos prejudiciais intensamente relacionados com o conceito de patrimonialismo de Max Weber, ou seja, quando há uma mistura do que é público e do que é privado. O primeiro ponto negativo importante de ser ressaltado é a desqualificação da mão de obra no serviço público, uma vez que os empregados não precisarão mais passar pelo processo seletivo do concurso público, o qual garante que o aprovado possui as qualificações altas e necessárias para o cargo. A terceirização permite que a empresa contratada utilize de seu poder de escolha e influência para dar o emprego para pessoas de interesse pessoal, e não necessariamente para aquelas com maior qualificação profissional. Um segundo ponto remete à terceirização não só das atividades-meios da empresa, ou seja, de atividades secundárias da empresa contratante (serviços de limpeza e segurança, por exemplo), como era feito antes da Lei, mas também das atividades-fim, ou seja, das atividades específicas realizadas, como terceirizar um caixa bancário num banco estatal, por exemplo. Tal ação, relacionada à ideia do patrimonialismo, aumenta as possibilidades do mau funcionamento do órgão empregador devido às más colocações da Lei da Terceirização.
A empresa que utilizar, em larga escala, da mão de obra terceirizada enfrentará um aumento considerável das despesas com seus trabalhadores. Isso se deve ao fato de que, antes da Lei, a empresa contratante deveria pagar aos seus funcionários apenas o referente aos seus salários e benefícios. Com a nova Lei, é de obrigação da empresa contratada pagar tais custos. Têm-se, então, a falsa noção de que não haverá diferença nos gastos com os trabalhadores por parte da empresa contratante. Porém está atribuído à quantia gasta à empresa terceirizadora o lucro, aumentando consideravelmente os custos da empresta contratante dos serviços dos terceirizados. Esse conceito de lucro está relacionado à ideia de Mais-valia do sociólogo Karl Marx, que seria o valor acumulado com o trabalho, mas sem ser repassado aos trabalhadores.
Torna-se evidente que a Lei da Terceirização não contribuirá, de forma positiva, para a sociedade brasileira. Os prejuízos serão amplos, indo desde os trabalhadores terceirizados, os quais não terão a devida atenção e garantia de seus direitos trabalhistas, até os empregadores, que sofrerão por aumento de custos e desqualificação de sua mão de obra. A Lei foi criada para garantir a necessária burocracia ao sistema trabalhista brasileiro, ou seja, o que Max Weber entendia como a regulamentação das tarefas sociais por meio de regras e procedimentos escritos. Porém, os termos da Lei resultaram numa tentativa falha e equivocada de atingir a tal burocracia werberiana.
Rafael Foschete Meirelles
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